quinta-feira, 24 de dezembro de 2015

Além do meme: Vingador e seu cavalo voador

   O meme a seguir levanta um (hilário) questionamento que parece muito, muito válido...




   ...Para quem não tem afinidade com Role Playing Game - RPG (jogo de interpretação de papéis) e/ou desconhece o seguinte fato: O desenho animado conhecido no Brasil como "Caverna do Dragão" foi baseado no mais antigo "RPG de mesa comercial", o famoso D&D, sigla de Dungeons & Dragons (Masmorras e Dragões). Aliás, esse é o nome original da série animada.





   Ora, o que isso tem a ver? Tudo, já que a montaria do Michel Temer Vingador não é um simples cavalo ou arremedo de pégaso sem asas, mas sim uma besta mágica conhecida como "pesadelo", a qual, em D&D, não necessita de asas para voar. Em inglês, o nome desse tipo de criatura é nightmare e é por meio dele que fica possível entender o porquê de a montaria do Vingador ter a aparência equina que tem: ele é visivelmente composto pela palavra night, que significa "noite" ou "da noite, noturno" (dependendo do contexto), e por outra não tão facilmente reconhecível, mare, que uma consulta a um dicionário (não qualquer dicionário, infelizmente) revela significar "égua", ou seja, um pesadelo/nightmare é uma "égua da noite".

   Apesar de parecer, a princípio, um nome estranho, se tomado literalmente, ou simples demais ou que não teria a ver com os poderes e a natureza da criatura - afinal de contas, por qual motivo se chamaria tal besta mágica de "égua noturna" quando se poderia chamar de, sei lá, "aterrorizador dos sonhos"? - poder-se-ia considerar que o "night" seria uma referência a alguma deusa da noite ou mesmo à Nix, divindade grega da noite que seria poderosa o bastante para conceder ou retirar a imortalidade alheia livremente, estando acima de Zeus e sendo temida por ele (HELMSING. 2015, p.56).
   Deste modo, um nightmare seria uma espécie de égua relacionada a uma divindade da noite, talvez até mesmo pensada para puxar a sua carruagem, visto que era muito comum os deuses de antigas religiões possuírem carruagens ou veículos similares (como barcas e bigas) puxadas por animais "comuns", vide Thor, que tinha uma biga puxada por bodes (DAVIDSON. 2004, p.27), ou Apolo e Hades, cujos carros eram puxados por cavalos, entre outros. Essa seria uma ótima explicação, se fosse verdadeira.



O nightmare.

   O fato é que o desenvolvimento das línguas leva a coincidências linguísticas que podem, por vezes, dar a entender que duas línguas são aparentadas sem realmente serem, mas outro tipo de coincidência linguística leva ao surgimento de palavras com a mesma grafia e até mesmo com idêntica pronúncia, mas com raízes e significados distintos.
   Como exemplo disso, cito "manga" (de camisa) e "manga" (a fruta), que são escritas e pronunciadas da mesma maneira, mas são originárias de raízes distintas e mesmo de línguas distintas, aquela sendo oriunda do Latim manicus, derivado de manus (mão), enquanto a segunda é oriunda do Malaio manga, denominação da fruta.
   Pois bem, o que se tem em relação ao nome nightmare também decorre de uma coincidência linguística, visto que o segundo elemento de composição, -mare, não possui apenas a acepção de "égua" - aliás, neste caso, é termo oriundo do Antigo Inglês da Mércia, mere, ou da Saxônia Ocidental, myre, feminino de mearh (cavalo), oriundo do Proto Germânico *markhjon-, dito como originário do Gaulês, considerando-se o Irlandês e o Gaélico marc, o Galês march e o Bretão marh, todos significando "cavalo".
   Agora, mare enquanto "área sombria na Lua, largo" é termo oriundo do Latim mare (mar), havendo registro na Língua Inglesa desde 1765, tendo sido usado por Galileu para certas características da Lua - pensava-se que tais regiões eram mares como os da Terra.
   Finalmente, chegamos ao mare com a acepção que aqui nos interessa, isto é, "goblin noturno, íncubo", sendo um termo oriundo do Antigo Inglês mare (íncubo, pesadelo, monstro), derivado de mera, maere, do Proto-Germânico *maron, significando "goblin" e derivando do Proto-Indo-Europeu (PIE) *mora-, o qual consta como primeiro elemento de composição do Antigo Irlandês Morrigain ("demônia dos cadáveres" ou, literalmente, "rainha do pesadelo") e originou o Búlgaro e o Servo mora, o Tcheco mura e o Polonês zmora, todos significando "íncubo". Harper também diz que esse termo do PIE se encontra no Francês cauchemar, cujo primeiro elemento de composição seria o verbo caucher (pisar), e que *mora- viria da raiz *mer- (algo como "esfregar até sair, causar dano, prejudicar").



Uma miniatura de um nightmare.

   Note que o "Monster Manual" e materiais "rpgísticos" derivados mencionam certo cauchemar como uma variante mais aterrorizante do nightmare e que, pelas informações acima, a impressão que se tem é que muito provavelmente a representação do nightmare e de sua variante como um equino assustador se deu por conta de um trocadilho intencional. Aliás, algumas representações do nightmare que encontrei pela internet (principalmente as que trazem a dita criatura com crina e cauda flamejante ou que parecem ser compostas de fogo) inicialmente me levaram a relacioná-lo (só um pouco) com a nossa mula sem cabeça e também a me questionar se o pokemon Ponyta e sua evolução, Rapidash, teriam tido tal representação contemporânea e pop do nightmare como influência.





   Sobre a palavra nightmare, Harper diz o seguinte [1]:



Fins do século XIII., "um espírito feminino maligno afligindo os que dormem com uma sensação de asfixia," composto de night + mare (3) "goblin que causa pesadelos, íncubo." O significado foi alterado no meio do século XVI do íncubo para a sensação sufocante que ele causa. O sentido de "qualquer sonho ruim" foi primeiramente registrado em 1829; aquele de "experiência muito angustiante" é de 1831. Cognato com o Holandês Médio nachtmare, Alemão Nachtmahr.



   Agora, como os termos goblin e incubus aparecem com frequência, creio que seja necessário entendê-los para melhor compreender o nightmare - por mais que aqueles que joguem RPG ou estejam de alguma forma imerso na cultura pop, onde ambos se fazem presentes, tenham familiaridades com eles.




Um típico goblin de RPG.


   Então, sobre o goblin [2]:



Começo do século 14, "um demônio, íncubo, fada perniciosa e feia,", do Francês Normando gobelin (século 12., como o Latim Medieval Gobelinus, o nome de um espírito que assombrava a região de Evreux, na crônica de Ordericus Vitalis), de origem incerta; é dito que não está relacionado com o Alemão kobold (ver cobalt), ou do Latim Medieval cabalus, do Grego kobalos "ladrão impudente, valete," kobaloi "espíritos maus invocados por ladrões," de origem desconhecida. Outra sugestão é que ele é um diminutivo do nome próprio Gobel.

Embora o Francês gobelin não tenha sido registrado até quase 250 anos depois do aparecimento do termo Inglês, ele é mencionado no texto em Latin Medieval dos anos 1100, e poucas pessoas que acreditavam na magia popular usavam Latim Medieval. [Barnhart]
Thou schalt not drede of an arowe fliynge in the dai, of a gobelyn goynge in derknessis [Salmo 91:5 na tardia Bíblia de Wycliffe, fins do século 14]


   Quanto ao outro termo, o que Harper diz no verbete incubus [3]:



"ser ou demônio imaginário, creditado como causador de pesadelos, e, em forma masculina, sendo consorte de mulheres no sono delas," c.1200, do Latim Tardio incubus (Agostinho), do Latim incubo "pesadelo, o que se deita sobre (o que dorme)," de incubare "deitar sobre" (vide incubate). O plural é incubi. Compare com succubus.



   Acaba nos levando ao seu oposto-complementar, o succubus [4]:



Fins do século XIV, alteração (depois que incubus, dando uma forma masculina a uma palavra geralmente percebida como de significado feminino) do Latim Tardio succuba "prostituta," aplicada a um demônio (geralmente na forma feminina) tendo conexão sexual com homens durante o sono deles, de succubare "deitar por baixo," de sub- "abaixo de" (vide sub-) + cubare "deitar" (vide cubicle). Relacionado: Succubine (adj.).



   A partir dos quais, considerando o fato de que as espécies de seres vivos e imaginários possuem um nome que também se refere ao gênero masculino (ex.: o leão, o grifo), pode-se concluir que o termo incubus, presente nas definições de nightmare, mare e goblin, se refere à espécie de demônios que se unem sexualmente às pessoas enquanto elas estão dormindo, bem como que tal espécie teria uma form humanoide ou a capacidade de assumi-la (para melhor executar o que lhe é atribuída por hábito). Mas e quanto ao folclore em si?




"The Nightmare", de John Henry Fuseli - note a cabeça de cavalo.

   Segundo Ashliman (2005) o nightmare ou mare (entre outros nomes) também é chamado de alp [5] em Alto Alemão, sendo um demônio que se senta no peito de quem dorme, provocando-lhe pesadelos. Aliás, além do inglês nightmare, os nomes dados para esse sonho ruim provocado por tal entidade são: martröð, em Anglo-Saxão e Islandês; mareridt, em Dinamarquês; mareritt, em Norueguês; e Alpdruck/Alpdrücke ou Alptraum em Alemão. Os três primeiros poderiam ser traduzidos como "passeio/carona/cavalgada de um mare", enquanto a tradução dos dois últimos seria, respectivamente, "pressão do Alp" e "sonho do Alp".
   Embora, logo no começo do seu trabalho sobre a entidade em questão, Ashliman (2005) tenha feito questão de deixar claro que o mare não se trata de uma égua, pode-se perceber aqui e ali uma relação entre tal demônio e os cavalos - a começar pela utilização de termos que podem ser traduzidos por palavras relacionadas a estes últimos, no caso, "ride" - o equivalente inglês de -röð, -ridt e -ritt - que pode ser traduzido como "passeio, carona, trajeto", mas também "cavalgada" ou "cavalgar", entre outros, e a palavra - a ideia é que a entidade em questão utiliza a pessoa como montaria enquanto ela dorme, sentando nela tal qual num cavalo.
   Outras mostras dessa relação se encontram nas menções em Ashliman (2005) de que: "alps muitas vezes montam cavalos alheios durante a noite, na manhã seguinte podendo-se ver como os bichos estão exaustos"; "eles também podem ser repelidos com cabeças de cavalo" [6]; a menção a cavaleiros em encantamentos para controlar ou afastar nightmares, no caso, São Jorge (Inglaterra) e Arthur (Ilhas Shetland); na comparação feita com o ser folclórico japonês de nome baku, é dito que o mesmo possui "rosto de leão, corpo de cavalo, rabo de vaca, topete de rinoceronte e patas de tigre".



Um baku. Ilustração de Matthew Meyer, segundo o qual,
o baku tem olhos de rinoceronte, cabeça de elefante, corpo de urso,
cauda de ox e patas de tigre.

   Aliás, por falar em comparação com seres de outros folclores, embora anteriormente eu tenha mencionado que algumas representações do nightmare enquanto cavalo inicialmente me levaram a relacionar esse ser à mula sem cabeça, o verdadeiro equivalente dele no folclore brasileiro [7] (como eu vi no decorrer da pesquisa) é a criatura feminina conhecida como "pisadeira".
   Segundo Alegria (2010):


A Pisadeira é uma velha de chinelos que surge no meio da noite e pisa sobre a barriga das pessoas, provocando falta de ar. Personificação do pesadelo, geralmente "ataca" quando as pessoas comem demais e vão dormir com o estômago cheio.

De acordo com a lenda, a Pisadeira passa grande parte do tempo nos telhados das casas. Ela fica observando o movimento dentro das casas. Após o jantar, quando alguém vai dormir de barriga cheia, ela entra em ação.
Sai de seu esconderijo e pisa no peito da pessoa, deixando-a em estado de paralisia. Porém, a vítima da pisadeira consegue acompanhar tudo de forma consciente, o que traz grande desespero para a pessoa, pois nada consegue fazer para sair da situação.


   Onde é possível perceber a semelhança sonora entre o nome do ser (obviamente oriundo do verbo "pisar" acrescido da forma feminina do sufixo indicativo de agente "-eira" e mais a consoante de ligação "-d-") e a palavra "pesadelo" e traçar a relação entre do ato de pisar com a menção que Ashliman (2005) faz à crença de que, na Polônia e na Alemanha, uma menina com o pé defeituoso seria um mart (outro dos nomes do nightmare/mare/alp).

   Já Cascudo (2012, p.322), diz que:



O pesadelo, a nocturna oppressio romana, sempre foi explicado pela intervenção maléfica de um íncubo, demônio ou espírito perverso. Para quase todos os povos da Terra, o pesadelo, a clássica Onirodynia, era devido a um gigante ou um anão, uma mulher ou um homem horrendo que, aproveitando o sono, sentava-se sobre o estômago do dormente e oprimia-lhe o tórax, dificultando a respiração. Em português e espanhol (pesadilla) deriva de peso, pesado. Na maioria dos outros idiomas, conserva-se o vestígio da velha tradição sobrenatural do Pesadelo.



   E ele também menciona (2012, p.322) os nomes já vistos aqui, juntamente com o Italiano ínculo, e o que os indígenas brasileiros dizem a respeito do pesadelo:



(...) Não é dispautério crer o indígena brasileiro que o Pesadelo era uma velha que o visitava, com seu cortejo de agonias indizíveis. Chamavam-na os Tupis, Kerepiíua. Não era bem a Kerpi-manha, a mãe do sonho, correspondendo ao Anabanéri dos Baniuas, moça sem pernas que descia do céu no arco-íris, e que era o sonho. Quando, depois da catequese, Jurupari passou a significar "demônio noturno", aparecendo junto aos adormecidos guerreiros, traduzia-se seu nome como sendo a contração de í-ur-upá-ri, o que vem à, ou sobre a cama, na lição de Batista Caetano de Almeida Nogueira.



   O autor também afirma (2012, p.323) que os maiores elementos do Pesadelo brasileiro vieram de Portugal, mencionando o "Tradições Populares de Portugal", de J. Leite de Vasconcelos, livro no qual estariam reunidas algumas versões que ainda hoje seriam as explicações da origem de nossa Pisadeira.

   Ele também destaca que, em Algarve, a função do pesadelo é feita pelo Fradinho da Mão-Furada, o que não é algo a ser estranhado, dada a capacidade deste ser adentrar nas casas pelo buraco da fechadura, tal qual o alp, conforme mencionado por Ashliman (2005), ou mesmo a relação que se pode traçar entre a mão furada do pesadelo algarviense e a possibilidade de se afastar o alp , como informado por Ashliman (2005), através do simples encostar do polegar na palma da mão dele.
   Ainda sobre os elementos lusitanos do Pesadelo brasileiro, Cascudo (2012, p.323) relata que Portugal, por sua vez, herdara a sua nocturna oppressio da Provença (na França), região que exerceu longa e poderosa influência nas terras portuguesas e na qual o Pesadelo é uma velha com as manias da Pisadeira, sendo que, somente lá e em Portugal, ela desce pela chaminé até o tórax de quem dorme. Para demonstrar isso, o autor cita Mistral que, no canto VI do Mireio [8], evoca a Chauchovièo, a feia, apontada por Cascudo (2012, p.323) como a legítima progenitora da Pisadeira:


Eila, vesés la Chaucho-vièio?

Pèr lou canoun di chaminèio,
Davalo d'a cachoun sus l'estouma relènt
De l'endourmi que se revésso;
Mudo, se i'agrouvo; l'óuprèsso
Coume uno tourre, e i'entravésso
De sounge que fan afre e de pantai doulènt.


   A tradução portuguesa de F.R.Gomes Junior (p.39, H.Garnier, 1910) [9] também é dada por Cascudo (2012, p.323-324) e a reproduzo aqui:



Por aí vedes o Pesadelo?

Pelo tubo das chaminés
Desce furtivamente sobre o peito úmido
Do adormecido que cai;
Mudo, se agacha, o oprime
Como uma torre e o encabresta
De sonhos que fazem horror e dolorosos.



   Só que Portugal não é o único a ter os seus pesadelos, a Espanha também os possuindo. Canales e Callejo (1994) fazem um trabalho completo de classificação dos diferentes seres denominados "duendes" em tal país e, dentro da classificação "los duendes dañinos de dormitorio" (os duendes daninhos de dormitório) ou apenas "D.D.D.", eles diferenciam (1994, p.113) os duendes-vampiros (efialtes) dos duendes-lascivos (íncubos), sendo que, dentre os primeiros, incluem tardos, ingumas, pesantas, manonas e pesadiellus.

   Os autores explicam que a classificação "duendes-vampiros" se dá porque tais seres se alimentariam de energias sutis e vitais dos seres humanos e, importante, diferenciam o ser conhecido como pesadillo (não confundir com o pesadiellu) do ser conhecido como pesanta, visto que, como eles próprios dizem (1994, p.116), muitos autores utilizam de tais nomes indistintamente, como se fossem exatamente a mesma criatura, sendo que aquele é menos danoso do que este e se enquadra na categoria de duende doméstico.
   Pois bem, antes de falarmos sobre a pesanta - já que a mesma foi mencionada por Cascudo (2012) e é mais facilmente associada ao nightmare e afins quando se procura sobre na internet -, é válido falar dos outros seres que Canales e Callejo (1994) reuniram sob a mesma classificação.
   Basicamente, todos os cinco possuem os mesmos hábitos de entrar na casa alheia durante à noite e causar sufocamento e pesadelos em quem dorme, mas, enquanto o tardo, a pesanta e o pesadiellu [10] pressionam o peito da vítima, a manona pode causar o sufocamento ao apertar o pescoço, ao passo que o inguma sufoca suas vítimas apenas por esse último método.
   Eles são todos muito parecidos, só diferindo mais ou menos quanto à aparência e, principalmente, quanto à região da qual são oriundos, sendo possível até mesmo dizer que o tardo e o inguma seriam como raças de uma mesma espécie, dada a sua aparência de duende e a mania de terem que parar tudo o que estão fazendo para contar grãos - sendo que só sabem contar até 100, número a partir do qual se perdem nos cálculos e começam tudo de novo...
   A pesanta, a manona e o pesadiellu, por outro lado, são mais próximos no que tange à aparência, a primeira sendo mais próxima da segunda que, sem dúvida alguma, possui laços muito mais estreitos com o terceiro, isso porque a pesanta, embora tenha aparência de bruxa ou de um animal indefinido em certas regiões catalãs (como no vale de Bianya, na Garrotxa), possui a forma de um cachorro gordo, negro e peludo na Catalunha em geral, a manona (literalmente: mãozorra) gosta de manifestar-se como um cão negro ou, como o seu nome sugere, uma grande mão peluda, sendo que o pesadiellu também adota esta última aparência.



Acaba sendo meio difícil não relacionar a manona
e o pesadiellu em forma de mão gigante com a wallmaster,
uma criatura dos jogos da franquia The Legend of Zelda,
tanto pela aparência em forma de mão gigante,
quanto por ela cair sobre Link...

   Agora, quanto à "pesanta", embora o seu nome inicialmente possa dar a entender alguma relação com o nome da "pisadeira", ele certamente advém da junção do verbo "pesar" (pesar, fazer peso) com o sufixo "-nta", designando um agente [11], de modo que o espanhol "pesanta" seria o mesmo que "(aquele) que faz peso" ou "(aquele) que faz pesar" - e Canales e Callejo (1994, p.) dizem isso.




Concluindo

   A montaria do Vingador não é um cavalo, mas sim um Pesadelo e, embora aqui e ali seja possível perceber alguma relação sendo traçada entre a personificação do Pesadelo e os cavalos, o mesmo não deveria ter essa aparência equina, já que o "-mare" em Nightmare nada tem a ver com a palavra mare (égua), porém, é um fato que a arte (vide a pintura que ilustra o texto) e a cultura pop (sobretudo o RPG e seus derivados) reforçam e solidificam mais e mais essa relação, reinventando a entidade folclórica.




Será que, além da criatura chamada "Nightmare",
aquelas, em Magic The Gathering
com "maro" no nome
foram inspiradas no Alp/Mare/Nightmare/Pesadelo?



NOTAS

[1] Original: late 13c., "an evil female spirit afflicting sleepers with a feeling of suffocation," compounded from night + mare (3) "goblin that causes nightmares, incubus." Meaning shifted mid-16c. from the incubus to the suffocating sensation it causes. Sense of "any bad dream" first recorded 1829; that of "very distressing experience" is from 1831. Cognate with Middle Dutch nachtmare, German Nachtmahr.


[2] Original (ainda não consegui uma tradução integral aceitável da última parte desta citação): early 14c., "a devil, incubus, mischievous and ugly fairy," from Norman French gobelin (12c., as Medieval Latin Gobelinus, the name of a spirit haunting the region of Evreux, in chronicle of Ordericus Vitalis), of uncertain origin; said to be unrelated German kobold (see cobalt), or from Medieval Latin cabalus, from Greek kobalos "impudent rogue, knave," kobaloi "wicked spirits invoked by rogues," of unknow origin. Another suggestion is that it is a diminutive of the proper name Gobel.

Though French gobelin was not recorded until almost 250 years after appearance of the English term, it is mentioned in the Medieval Latin text of the 1100's, and few people who believed in folk magic used Medieval Latin. [Barhart]
Thou schalt not drede of an arowe fliynge in the dai, of a gobelyn goynge in derknessis [Psalm 91:5 in the later Wycliffe Bible, late 14c.]

[3] Original: "imaginary being or demon, credited with causing nightmares, and, in male form, consorting with women in their sleep," c.1200, from Late Latin incubus (Augustine), from Latin incubo "nightmare, one who lies down on (the sleeper)," from incubare "to lie upon" (see incubate). Plural is incubi. Compare succubus.


[4] Original: late 14c., alteration (after incubus, giving a masc. form to a word generally felt as of female meaning) of  Late Latin succuba "strumpet," applied to a fiend (generally in female form) having sexual connection with men in their sleep, from succubare "to lie under," from sub- "under" (see sub-) + cubare "to lie down" (see cubicle). Related: Succubine (adj.).


[5] E essa palavra estaria etimologicamente relacionada ao termo "elfo". 


[6] Não tem nada a ver - exceto pelo homem que estava dormindo e pela cabeça de cavalo-, mas lembrei da icônica cena de "O Poderoso Chefão".


[7] Tal lenda é corriqueiramente apontada como "pertencente" ao estado de São Paulo e parte do de Minas Gerais.


[8] Frederi Mistral ou Frédéric Mistral é autor do poema provençal Mirèio, chamado Mireille em Francês e também conhecido como Mirèlha.


[9] H.Garnier é a editora pela qual a tradução de F.R.Gomes do poema provençal de Frederi Mistral foi publicada em 1910, como pode ser visto aqui e aqui.


[10] Embora ele possa assumir a forma de uma mão enorme, os autores não deixaram claro se ele pode engasgar a vítima e nenhum dos dois relatos apresentados por eles trás esse método, havendo apenas o da pressão no peito.



[11] Esse sufixo agentivo também existe em Português, tendo pouca produtividade em relação a outros sufixos agentivos, como -nte, de caráter neutro - em se tratando de gêneros gramaticais (sim, eu penso que tirar a neutralidade do termo "presidente" não passa de populismo e desserviço - se há tanta necessidade de se afirmar o gênero do empossado, que se utilize corretamente os artigos, pronomes demonstrativos e afins).







REFERÊNCIAS

ALEGRIA, Cátia Marilza Dias. A lenda da Pisadeira. Publicado em: 07 Dez 2010. 15h09min. Disponível em: <http://lendasdobrasil.blogspot.com.br/2010/12/lenda-da-pisadeira.html>. Acesso em: 13 Dez 2015.

ASHLIMAN, D.L. Night-mares: Demons that cause nightmares. Revisado em: 23 Mai 2005. Disponível em: <http://www.pitt.edu/~dash/nightmare.html>. Acesso em: 14 Dez 2015.


CANALES, Carlos; CALLEJO, Jesús. Los duendes dañinos de dormitório. In:___. Duendes: Guía de los seres mágicos de España. Madri: EDAF, 1994.


CARTON, Jans. Nightmare. Disponível em: <http://www.d20srd.org/srd/monsters/nightmare.htm>. Acesso em: 07 Dez 2015.


CASCUDO, Câmara. Pisadeira (São Paulo, fronteiras de Minas Gerais). In:___. Geografia dos mitos brasileiros. São Paulo: Global, 2012. 1ª ed. digital. p.322-324.

DAVIDSON, Hilda Roderick Ellis. Deuses e mitos do norte da Europa: Uma mitologia é o comentário específico de uma era ou civilização sobre os mistérios da existência e da mente humanas. Tradução: LEAL, Marcus  Malvezzi. São Paulo: Madras, 2004


HARPER, Douglas. Goblin (n.). In:___. Online Etymology Dictionary. 2001-2015. Disponível em: <http://www.etymonline.com/index.php?term=goblin&allowed_in_frame=0>. Acesso em: 08 Dez 2015.


HARPER, Douglas. Incubus (n.). In:___. Online Etymology Dictionary. 2001-2015. Disponível em: <http://www.etymonline.com/index.php?term=incubus&allowed_in_frame=0>. Acesso em: 09 Dez 2015.


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HARPER, Douglas. Succubus (n.). In:___. Online Etymology Dictionary. 2001-2015. Disponível em: <http://www.etymonline.com/index.php?term=succubus&allowed_in_frame=0>. Acesso em: 09 Dez 2015.


HELMSING, Clifton. Nyx. In:___. The Esoteric Codex: Deities of Night. 2015. p.56-60. Disponível em: <https://books.google.com.br/books?id=QmDTCgAAQBAJ&dq=Zeus+had+fear+of+Nyx&hl=pt-BR&source=gbs_navlinks_s>. Acesso em: 24 Dez 2015.

LIMA, Felipe de. 10 fatos e curiosidades sobre Caverna do Dragão. Publicado em: 10 Mar 2015. Disponível em: <http://legiaodosherois.uol.com.br/lista/10-fatos-e-curiosidades-sobre-caverna-dragao.html>. Acesso em: 07 Dez 2015.

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MEYER, Matthew. Biography. Disponível em: <http://matthewmeyer.net/biography/>. Acesso em: 24 Dez 2015.


MISTRAL, Frederi. Mirèio. Disponível em: <http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k72561g/f3.image>. Acesso em: 24 Dez 2015.


RODRIGUES, Sérgio. A manga, a manga e a mangueira: Coincidência? Publicado em: 31 Mar 2014. Disponível em: <http://veja.abril.com.br/blog/sobre-palavras/consultorio/a-manga-a-manga-e-a-mangueira-coincidencia/>. Acesso em: 08 Dez 2015.

Um comentário:

  1. E se "nightmare" significasse apenas o que essa palavra em inglês significa, "pesadelo"?

    Mas muito interessante essas possibilidades rs.

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